terça-feira, 13 de julho de 2010

Borrachada

Meu coração bate forte e minhas mãos estão úmidas como o dia que amanheceu chuvoso depois de uma longa estiagem. Um árduo caminho percorre aquele que naturalmente vive em sociedade.
Hoje se fala muito em bulling. Estudei num colégio particular de padres. Não me lembro de outro negro na escola. Um dia os alunos puderam levar um brinquedo para escola e uma das crianças levou o mais cobiçado. Causou alvoroço e a professora organizou uma fila para que um a um pudesse brincar. O brinquedo era jogado em dupla, mas mesmo perdendo, o dono nunca se levantava. Quando chegou minha vez, ao ver o único negro da escola disse: Você não – me empurrou e com o cotovelo quebrei uma janela. Carrego a cicatriz até hoje. No corpo e n’alma.
Cresci. Aprendi a me defender. Briguei bastante. Não levava desaforo pra casa, era o que se dizia. E eram outros tempos. Não se andava armado como num faroeste, como é hoje. Era chute e soco e muito hormônio adolescente no ar. Por conta disso, muitas vezes perdíamos a razão. Antes vitimas, depois agressores. Inversão de papéis e sensação de injustiça.
Ultimo fim de semana fui para minha cidade no interior paulista para o aniversário da minha irmã. Coincide com o aniversario da cidade e todo ano nessa data acontece a Festa do Peão.
Durante o dia teve um churrasco na casa dos meus pais e minha Irma chamou os amigos para comemorar. Já de noite, me convenceram a ir à festa do peão.
Cresci nessa cidade, muitos amigos e lembranças boas quando me lembro de festas que fui. Numa cidade de 30mil habitantes uma festa como essa é um acontecimento. Indo a pé para festa, pensei que poderia encontrar algum amigo das antigas e poderia ser no mínimo nostálgico.
25 reais para entrar. Show do Milionário e José Rico. Coragem.
Cavalos e bois pularam com os escrotos amarrados, a arena se abriu e foi tomada pela população para assistir o show da noite. Viola vai viola vem, fomos para fora da arena. Tomando a terceira latinha resolvi ir ao banheiro. Vi o símbolo do homem e a palavra “Homem” logo abaixo. Banheiros químicos. Quando fui entrar reparei que só haviam mulheres. Perguntei se era feminino, mesmo estando escrito homem elas não souberam responder. Perguntei se poderia usar o banheiro já que estava ali e elas disseram que sim.
Quando estava usando o banheiro alguém bateu forte na porta. Abotoei a calça e ao abri a porta de i de cara com o segurança da festa esbravejando que ali era banheiro de mulher.
Disse para ir com calma que ali na frente estava escrito Homem, e que se não era pra usar que me desculpassem. Escutei a frase: E se fosse sua mulher que tivesse usando o banheiro?
O que? Ta louco? Olha ali – apontei para o símbolo - _ está escrito homem.
Você vai pra fora da festa – disse o segurança já empunhando um cassetete.
Outro segurança chegou já falando que eu iria sair da festa. Começaram me empurrar e eu tentei permanecer no lugar. Com as mãos baixas para evitar qualquer confusão maior:
_ seu guarda- estava de farda, mas era apenas segurança, mas foi o que me pareceu mais respeitoso- _Não quero causar confusão nem brigar, só quero esclarecer que no banheiro esta escrito homem, se errei me desculpe, mas não vou sair da festa por causa disso, não estou querendo confusão.
Você vai sair sim – cutucando-me com o cassetete.
Um outro segurança chegou e depois de mais algumas farpas trocadas ambos começaram me deferir golpes de borrachada. Fui agarrado e posto para fora da festa.
Indignado exigi falar com um organizador da festa. Fui empurrado por um outro segurança e ao cair no chão ainda levei alguns chutes. Ao me levantar a PM compareceu e ao invés de me ajudar me mandou embora ameaçando me bater mais.
Andando de volta para casa entendi porque tanta gente morre a toa. Quantas vezes já escutei que depois de uma “treta” fulano vai pra casa pega o revolver e volta atirando em todo mundo.
Lembrei do dia que fui empurrado na escola e cortei o cotovelo e de tantas injustiças que vivi. Lembrei das brigas de adolescente e que toda vez que revidei me dei mal. E dessa vez, nada que fiz justifica a atitude tomada por aqueles que deveriam me proteger.
Fui a delegacia, ao hospital, ao advogado e estou processando a festa. Nomes e lugares foram poupados justamente por isso.
No fim de tudo a pergunta que fica é por quê? Tanta coisa errada que acontece no mundo e o dialogo que deveria ser o começo de uma melhoria esta cada vez mais distante das bocas e dos ouvidos. Por falta de pratica uma hora ou outra acabaremos nos matando.
Agora só “quero que a justiça seja feita”, usando esse jargão que tantas pessoas injustiçadas proclamam nos noticiários diariamente.

5 comentários:

  1. Eu só posso expressar a minha vergonha e pedir desculpas pela ignorância do ser humano. Não sei dizer se todos são assim. Eu tento ao máximo reprimir qualquer impulso animalesco meu mas, não sei quem mais consegue. Sinto muito por ter passado isso. Você para mim é o que há de mais amado no mundo! :-)

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  2. Vivemos num mundo intolerante, infelizmente educação e respeito ao próximo é algo raro nos dias atuais. Fiquei muito chateada com este episódio e espero que essas pessoas sejam punidas.

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  3. Olha, ao contrário de vc, tem horas que desejo a declaração de um "estado de sítio interno", ou seja, um direito de suspensão do tal 'estado de direito', só que advindo de nós, fracos civis. Vc não teria motivo melhor pra quebrar a cara desses filhos da puta, concorda? Que inda por cima, detém armas e cacetetes.

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  4. seria melhor se todos estivessem na Puta que Pariu.... eu ajudo na passagem!!!!!!! rsrsrsrs

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  5. A JUSTIÇA APROVOU UMA NOVA LEI ONDE NEM MESMO AS "PALMADINHAS EDUCATIVAS " SÃO PERMITIDAS, PODENDO LEVAR OS POSSIVEIS PAIS " AGRESSORES" A PERDEREM A GUARDA DE SEUS FILHOS POR TENTAREM CORRIGI-LOS... A LEI NOS IMPEDE DE EDUCARMOS NOSSOS FILHOS, MAS SE OMITE, QUANDO PESSOAS DESPREPARADAS E DESQUALIFICADAS AGRIDEM E ATÉ MESMO MATAM INOCENTES...
    PARABÉNS BRASIL!!!

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