terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Consolação

Uma senhora espatifou no chão. Atravessando a consolação, tropeçou no vento se enroscou no ar e esticou-se no meio da faixa de pedestres.
Apreensão e suspense pairaram no instante infinito de alguns minutos.
Parei a bike em frente aos carros parados no sinal vermelho protegendo o corpo franzino da senhora, deu pra ver os olhares atentos dos motoristas. Pés descalços e sujos, meio inchados e machucados se aproximaram. Meu olhar estava no chão junto com a senhora e suas sacolinhas do “Ladrão de Açúcar” espalhadas no asfalto quente. Os pés eram de um mendigo que prontamente saiu de seu estado de inércia urbana para socorrer a pobre.
Um carrinho, cheio de bugigangas e quinquilharias estacionado ali do lado, era outro mendigo. Supostamente a senhora havia tropeçado nesse carrinho. O rapaz dono do carrinho segurava em um dos braços da senhora ao mesmo tempo em que não soltava o carrinho. Devia ser de muito valor para ele. Eu observando só vi lixo, mas para ele havia um valor inestimável com certeza.
Algum bancário, ou qualquer outro tipo executivo que perambula pela Av.Paulista segurou a senhora por trás dando mais firmeza para que ela se levantasse.
O sinal abriu. Não me movi e não deixei os carros andarem. Ouvi uma buzina lá de trás, alguém que não viu o que aconteceu e como um rato de laboratório ficou condicionado a ver o verde e acelerar, se não der pra acelerar buzina. Eu só tinha olhos para a senhora que estava passando por um crivo de experts em acidentes domésticos: 1 doméstica de uniforme, 1 bancário, 2 mendigos e 1 ciclista. Ninguém de branco, mas todos passando os olhos por todo corpinho da senhora em busca de ralados, cortes e afins. Tudo em ordem. As buzinas aumentaram quando o sinal ficou amarelo.
O mendigo descalço de pés inchados devolveu as sacolinhas para a senhora e continuou com fome. O mendigo do carrinho pediu desculpas por qualquer coisa e seguiu o rumo. O bancário acompanhou a senhora até a calçada. A doméstica saiu rindo e balançando a cabeça. Eu afivelei o capacete novamente e continuei a pedalada e o tempo voltou ao seu fluxo normal. A senhora? Ela sentiu o calor humano da megalópole são-paulina muitas vezes escondido entre concreto, carros, motos, estresse, correrias e preocupações. Ainda há esperança.

2 comentários: